Nos Eixos #10 — Nunca vai estar bom o suficiente (sobre perfeccionismo e autossabotagem)
O perfeccionismo e a autossabotagem sempre foram dois grandes problemas para mim, me impedindo de realizar aquilo que eu queria por nunca estar bom o suficiente.
Oi, aqui é o Victor! Escrevo essa décima edição da Nos Eixos com muito, mas muito orgulho. Esse é um projeto que sempre tive muita vontade de fazer acontecer para transpor a minha personalidade em algo próprio ao mesmo tempo que falo daquilo que gosto. Deu certo. E continua dando certo.
Na última semana, entre quinta e quarta-feira, atingimos 200 assinantes da newsletter. É muita gente. Menos de uma semana depois estamos próximos dos 300 assinantes. E eu sou absolutamente grato a cada um que está lendo esse texto. Sem vocês isso não aconteceria e com vocês tenho ainda mais ânimo para continuar me comprometendo com um projeto cada vez melhor. Muito obrigado.
Acompanhe essa publicação da Nos Eixos com algumas das músicas que tocaram enquanto eu escrevia e editava a newsletter. Ouça no Spotify ou no Apple Music.
Essa edição se tornou a minha favorita até agora.
Eixo X: algumas notícias da semana
A semana passada foi uma prévia do que será o ano na tecnologia: o domínio da inteligência artificial de conversação. A Microsoft impressionou com o Bing integrado com o ChatGPT que promete transformar as buscas. Um milhão de pessoas já estão na lista de espera, muito em breve o app chegará ao Android e iOS e quem conversou com a IA tem notado umas coisas estranhas (em inglês).
Enquanto isso, sem ter visto a bomba chegando e às pressas para apresentar um competidor à altura, o Google anunciou o Bard em um post e realizou um evento tão corrido que: 1) ainda não haviam notado um erro na resposta do Bard que dizia que o James Webb foi o primeiro telescópio a tirar uma foto de um planeta fora do sistema solar — esse feito é do Very Large Telescope e aconteceu em 2004. E 2) esqueceram de colocar um celular no palco para demonstrar uma das funcionalidades do Bard, criando este momento.
Recomendo muito a leitura deste texto do The Verge (traduzido pela Época) que detalha os 7 grandes problemas e perigos da IA na busca, incluindo o ChatGPT contar piadas sobre Krishna, deus do hinduísmo, mas não sobre Jesus, as respostas imprecisas como vimos no próprio teaser do Google Bard e a gigantesca necessidade por regulamentação em todo o mundo.
Sentado quieto no canto da sala, o Opera anunciou que vai integrar o ChatGPT na barra lateral (em inglês) do navegador. O recurso poderá resumir e listar destaques da página, algo que o novo Edge com “BingGPT” também será capaz.
A Netflix expandiu a proibição para compartilhamento de senhas e a novidade controversa chegou ao Canadá, Espanha, Nova Zelândia e Portugal. A pessoa dona da conta precisará configurar uma localização principal. Os usuários agregados que não moram na mesma residência poderão transferir o histórico para uma conta separada, mantendo histórico e favoritos, mas tendo que pagar a assinatura. Quem vive longe e ainda quiser compartilhar a conta precisará pagar por usuário adicional. Em Portugal o preço é de 3,99 euros, ou aproximadamente R$ 22.
O Nintendo Switch é o terceiro console mais vendido na história. Suas 122 milhões de unidades ficam atrás apenas do Nintendo DS com 154 milhões e do ainda soberano PlayStation 2, com 158 milhões. O Switch ainda pode se tornar o console mais vendido do mundo até 2025 se as vendas se mantiverem consistentes (e acredito que isso possa acontecer, mesmo com um sucessor chegando até lá).
A primeira prévia do Android 14 foi lançada para desenvolvedores com mais funções para otimização de aplicativos em smartphones dobráveis e em tablets.
O Disney+ perdeu 2,4 milhões de assinantes no último trimestre de 2022 e anunciou a demissão de 7 mil pessoas. Mas as contas vão bem: o Grupo Disney teve receita de 23,5 bilhões de dólares no período.
A Microsoft pode deixar de vender jogos em mídia física para o Xbox no Brasil. O Voxel teria entrado em contato com lojistas e confirmado a informação. O motivo seria o custo elevado e as baixas vendas. Obviamente, os consoles continuam sendo vendidos no país.
Star Wars Jedi: Survivor ganhou 9 minutos de gameplay (em inglês) e eu não vejo a hora de jogar — é difícil diminuir as expectativas porque amei o Fallen Order.
Andor teria sido a primeira produção Star Wars com um palavrão. Naquele discurso do fim da temporada, a pessoa iria falar “fuck the Empire” (ou “foda-se o Império”), mas um produtor interviu e tiveram que mudar para “fight the Empire” (ou “lute contra o Império”). Pelo tanto de coisas que Andor trouxe de inovação para a saga Star Wars, me dou por satisfeito sem um palavrão — mas confesso que deixaria o momento ainda melhor.
Mais um live-action do Homem-Aranha está chegando, dessa vez contando a história do Spider-Man Noir. A série foi encomendada pela Amazon e terá os produtores de Homem-Aranha no Aranhaverso (que até hoje ainda não assisti por completo).
O delicioso Espaço Itaú da Rua Augusta fechará para sempre esta quinta. Era um dos meus lugares favoritos de São Paulo, mas agora vai virar um prédio residencial.
Subiram todo o filme do Bob Esponja no Twitter, mas em inglês.
As gravações da terceira temporada de The Morning Show foram encerradas (!) e estreia ainda este ano (!!) no Apple TV+.
O iPhone 15 finalmente terá USB-C, mas a Apple pode limitar a conexão para funcionar apenas em cabos certificados ou entregar maior velocidade de recarga e transferência em cabos oficiais (aposto na segunda opção).
Um engenheiro impaciente colocou uma porta USB-C no iPhone (em inglês) e ainda manteve o conector Lightning. Outro colocou o USB-C no AirPods Pro.
Um novo MacBook Air de 15,5 polegadas pode chegar em abril, o que sustenta os rumores de que a empresa prepara seu clássico evento de primavera (no hemisfério norte) para o final deste primeiro quadrimestre.
O aguardado Mac Pro pode ser anunciado nesse evento, enquanto o Reality Pro (óculos AR/VR) seria o destaque da WWDC em junho.
A Apple pode ser obrigada a liberar navegadores com motor proprietário no iOS graças à Lei dos Mercados Digitais da União Europeia. Atualmente, todos os navegadores do iOS e iPadOS precisam rodar pela engine do WebKit, o que basicamente transforma o Chrome, o Edge e outros em um Safari redesenhado, já que a experiência é a mesma. A mudança levará todo o poder dos navegadores aos dispositivos móveis da Apple. Já era hora.
O próximo ano pode representar grandes mudanças para o Apple Watch: o novo Watch SE herdaria o lindo design do Series 7, o próximo Watch Ultra teria tela maior de tecnologia Mini LED (ainda mais brilhante que o atual) e um novo Watch “Series X” pode estrear com objetivo de se posicionar de forma semelhante ao iPhone X (número 10 em algarismo romano, não a letra X), trazendo visual renovado e soluções exclusivas para comemorar os dez anos de anúncio do Apple Watch.
Os serviços da Apple chegaram às TVs da LG com WebOS, incluindo Apple TV+, Apple Music, AirPlay e HomeKit (para controle da casa inteligente).
A Apple continua sendo a única big tech que não anunciou uma demissão em massa e agora sabemos o motivo: ela contratou poucos trabalhadores (em inglês) durante a pandemia, diferente da Microsoft, Alphabet/Google, Meta e Amazon.
Eixo Y: Nunca vai estar bom o suficiente
A cada semana eu luto para trazer um bom texto principal para vocês. Não é fácil reunir as notícias da semana e é trabalhoso falar das recomendações quando tenho consumido pouco, mas é muito mais complicado escolher e decidir um tema central.
Primeiro porque eu quero que vocês tenham algum tipo de aproveitamento, que leiam e saibam que isso foi escrito por uma pessoa real, que se importa com o tempo investido na newsletter e que quer adicionar algo à vida de vocês. E como a Nos Eixos não é apenas sobre tecnologia e entretenimento, nessa décima edição trago um pouco da minha saúde mental, e como a cobrança pessoal é um enorme pesadelo para pessoas perfeccionistas.
Por muito tempo adiei minha reestreia na produção de conteúdo por sempre querer ser melhor. Sim, reestreia. Tive um site e canal no YouTube no comecinho de 2016 chamado Techno1 (você pode ver os resquícios do TH1 aqui) que então evoluiu para o atual Eixo XYZ. Mas depois de 2018 percebi que estava me cobrando demais e que estava começando a deixar de ser prazeroso. Para evitar um surto, deixei a ideia na gaveta, mas o desejo sempre pairava por cima de mim.
Naquela época, impressionantes sete anos atrás (de forma alguma parece ser tanto tempo assim), eu já notava que tudo o que eu produzia não estava bom o suficiente. Seja pela minha dicção, por algum detalhe que não passei no texto, por algo que saiu errado no vídeo ou sei lá mais o que.
Ainda não sei de onde vem essa enorme cobrança em cima de mim mesmo, mas sei que ela continua existindo até hoje. E você pode ver isso não só comparando o Techno1 com o Eixo XYZ em uma evolução de sete anos como também nas artes dessa newsletter em um intervalo de apenas dois meses — porque não me contento com algo a não ser que esteja do jeito que eu quero que esteja.
Outra prova está no review do iPad Pro que publiquei no fim de semana. No momento em que eu editava a publicação pensei em pegar um dia para tirar novas fotos porque nem todas estavam me agradando. Ponderei por alguns minutos e reconheci que as fotos que tirei há meses eram muito mais que suficientes. Engoli meu perfeccionismo exagerado e publiquei do jeito que estava.
Depois que a poeira abaixa, que os dias passam, que dou um passo para trás e visito de novo o que criei, percebo que tudo aquilo, para alguém que produz um conteúdo para um público tão pequeno, é absurdo. Tanto em qualidade quanto em cuidado. E preciso reconhecer o que faço no momento que faço, não depois.
Outra grande barreira que me trava para produzir conteúdo está na autossabotagem. Às vezes é muito difícil reconhecer o meu valor e saber que eu não só estou indo muito bem como estou até mesmo muito acima da média.
Olha só para tudo o que eu fiz nessa edição da newsletter. O esforço, o comprometimento, o avanço semana após semana. Eu escrevo textos ótimos, tento colocar tudo de mim neles. Olha onde eu trabalho, em um dos maiores sites do Brasil depois de já ter passado por outro grande site de tecnologia do país. Eu sou excelente no que faço. Não sou? Será? Mas será mesmo? Acho que não…
Essa é uma linha de pensamento tão comum para mim que é estranho escrever e ler depois. E sei que fiz pouquíssimo avanço para me livrar disso.
O perfeccionismo e a autossabotagem me impedem de realizar as minhas vontades. Na verdade, eu me impeço disso. Adoraria ter uma solução para você que passa pela mesma experiência em um contexto diferente, mas infelizmente não tenho. Não ainda. E se por acaso algo te ajudou a melhorar nesse quesito, compartilhe comigo.
Parte do caminho para melhorar acredito estar trilhando da forma correta: a sessão com a psicóloga toda semana. Tem ajudado.
E ao mesmo tempo que reconheço (dias sim, dias não) que posso criar um conteúdo de qualidade e que já faço isso há muito tempo, mesmo não me valorizando o suficiente, vejo pessoas medíocres criando conteúdo ainda mais medíocre, automático e sem propósito nenhum. Tudo isso enquanto ganha mais notoriedade.
No meio de conteúdo de tecnologia você esbarra em uma pessoa assim sem esforço algum. É o tipo de gente que não se importa em transmitir uma mensagem, não se importa com quem está do outro lado e nem o tempo que essa pessoa está investindo, afinal, é só colocar um link de afiliado e ganhar comissão pelas vendas, não é?
Será que eu estou fazendo errado em querer ser bom demais? Eu deveria ser como eles? Olha só os achados da Amazon que você vai gostar: o novo Kindle está muito barato e você pode dividir em dez vezes sem juros, esse liquidificador é tudo que você poderia querer, esse item x é o que falta para você ser feliz!!!
É, não estou fazendo errado. Simplesmente não é assim que eu funciono, mesmo que isso não me dê retorno rápido, não me faça crescer de uma hora para outra e não atraia as assessorias de imprensa.
Não só quero dar o meu melhor como também quero que as pessoas saibam que a produção de conteúdo precisa mudar. Ela precisa se tornar mais humana, com criadores que se importam com o público e não com o número.
E adivinhe só? Não estava perfeito.
Eu escrevi quase todo este texto originalmente no fim de semana, entre os dias 11 e 12 de fevereiro. E é claro que ele não estava bom o suficiente para uma décima edição da Nos Eixos. Eu precisava entregar mais para vocês, sejam os que estão comigo desde as fases embrionárias, que pularam para dentro há poucas semanas ou os que acabaram de chegar há poucos dias. Eu tinha que honrar o número dez. E acredito que eu finalmente tenha feito isso depois de apagar todo o texto original e começar do zero.
Antes, nem mesmo tinha chegado a uma conclusão. Mas agora essa é uma à altura do que sou e do que quero representar.
Obrigado por ler. Obrigado por assinar. Só obrigado.
Eixo Z: as recomendações da semana
Na edição de número dez, trago as recomendações que me trazem bons sentimentos para você descobrir ou redescobrir, mesmo que eu já tenha sugerido alguns em edições passadas. Espero que goste.
Para ler.
A Metamorfose é um livro que me dilacera. Ele abaixa minhas guardas, me deixa sensível ao extremo e, naquele momento em que a porta do quarto é finalmente aberta, explode com todos os meus sentimentos.
Vejo a comunidade LGBTQIAP+ e minorias metamorfoseadas no inseto monstruoso de Kafka. Imagino as pessoas que não tiveram amparo da família, que foram tratadas como uma barata que chegou em casa procurando alimento, mas só encontrou nojo e repulsa.
Esse livro me dá arrepios e considero uma leitura fixa. Em algum momento do ano sei que vou revisitar A Metamorfose notando coisas que deixei passar, criando novas conexões com o que me acontece no momento e, para sempre, chorando muito.
Para ver.
Tales from the Loop me traz conforto em sua sensibilidade etérea de contar histórias estranhas de forma tão bonita.
É uma ficção científica extremamente rica, contemplativa e emocionante que, assim como A Metamorfose, me vejo assistindo a cada ano para ficar deslumbrado com a qualidade audiovisual do que o Prime Video produziu em sua série original de uma única temporada.
Os personagens são cativantes, a fotografia é deslumbrante, a história é sempre sensível mesmo nas histórias mais desconfortáveis e a carga emocional no fim da série me impede de terminá-la com o rosto seco.
Para ouvir.
Eu tenho um enorme vínculo de nostalgia com o The 2 Bears e os álbuns Be Strong de 2012 e The Night is Young de 2014. Ambos me trazem ótimos sentimentos e adoro quando finalmente revisito o indie eletrônico dançante de letras positivas sobre amores, liberdades, mudanças e transformações.
Be Strong é excelente de se apreciar e envelheceu muito bem em sua década de vida. Faixas como Be Strong, Work, Take a Look Around, Ghosts & Zombies, Time in Mind e Heart of the Congos me animam instantaneamente com a gigantesca carga nostálgica que carregam e suas deliciosas composições que também não me deixam parado.
The Night is Young mantém a qualidade com faixas positivistas e animadas, mas agora com maiores nuances tanto em composição quanto em escrita. Angel (Touch Me), Not This Time, Unbuild It, My Queen e The Night is Young sempre serão fenomenais e é impossível eu me enjoar de alguma delas.
Sempre me reconecto comigo mesmo ouvindo esses álbuns, e agora é um desses momentos que tanto preciso ter o apoio da música para me fazer sentir bem.
Para jogar.
A forma com que Celeste lida com ansiedade, superação e autoconhecimento é tão bem feita que transpõe isso na complicada jogabilidade. O jogo me faz morrer centenas de vezes e nunca me deixar desistir por que sei que preciso subir a montanha e concluir essa conquista. Por Madeline (a personagem controlável) até mais do que por mim mesmo.
Sem querer acabei recomendando quatro mídias que revisito todos os anos. Celeste é um dos jogos que eu amo jogar de novo por marcar bastante o momento em que eu estou jogando, seja pela sua ótima dificuldade, personagens cativantes ou momentos muito emocionantes e carinhosos que deixa toda a experiência gravada na memória.
O jogo — e mais especificamente sua DLC Adeus — serviu como uma jornada de autoconhecimento da criadora do jogo Maddy Thorson, que se descobriu uma mulher trans.
Quando Madeline olha pro espelho e vê a outra “ela”; quando ela tenta abandonar seu reflexo, que então arrasta ela pro fundo da montanha; quando as duas se reconciliam e se tornam uma pessoa mais forte e mais completa… Tudo ali tinha sido escrito por uma perspectiva trans.
Ela comenta sobre tudo isso em seu texto no Medium e, se você já jogou Celeste, ainda vai jogar ou nem mesmo teria interesse no jogo, recomendo a leitura de toda forma.
Obrigado por ler a Nos Eixos. Essa edição de número dez foi feita com muitíssimo carinho, dedicação e, agora, bastante sono. Espero continuar à altura do que quero entregar a todos vocês com um pouco menos de perfeccionismo e zero autossabotagem, e que possamos ver nossa evolução ano a ano para que nos tornemos pessoas melhores.
Muito bom! Bem maneira a ideia de linkar uma playlist. Eu fazia isso no meu antigo medium e é legal pro leitor ter esse background musical
Parabéns pelo texto!